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sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Mulheres de Hoje - Conto 4


Aliança


Nara caminhava calmamente pela rua quando parou diante daquela vitrine. Lá estava o objeto de seu desejo mais secreto exposto em destaque, a aliança de brilhantes da famosa joalheria.

Imediatamente as lembranças vieram-lhe a cabeça, e recordou de quando era adolescente e sonhava com aquela aliança. Achava que era só encontrar o príncipe, pois a aliança viria embutida no pacote. Seria o símbolo do amor correspondido dado por ele.

Mais adulta percebeu que não seria qualquer príncipe que lhe daria a tão sonhada aliança, e com os pés fincados na realidade abstraiu seu desejo material, atendo-se aos valores verdadeiramente importantes para eleger aquele que seria o seu companheiro, pois nesta altura não acreditava mais em príncipes.

Um pouco mais madura, com o olhar voltado para a família formada, reconheceu seu valor, se orgulhou de seus feitos, errou em outros tantos, e mais fortalecida reparou que as escolhas foram corretas, que a paz e felicidade foram conquistadas. Mas a aliança continuava na vitrine da famosa joalheria.

Com seu habitual conformismo, olhou para a vitrine e ponderou que a aliança não lhe fez falta, e que talvez até pudesse ter em suas mãos uma idêntica, mas teria de ter mudado algumas opções, não deveria ter cometido alguns erros, poderia ter exigido a prova adolescente do amor verdadeiro.

Mas o que teria mudado?

Continuou a ver as vitrines pois não conseguiu a resposta, e talvez nunca a tenha.

Tal qual a aliança que teima em  permanecer na vitrine...

terça-feira, 23 de novembro de 2010

Pensar... é preciso


"Pensamentos são como gotas d'água. Se eu penso nas mesmas coisas o tempo todo, estou criando uma imensa massa de água. Se meus pensamentos são negativos, posso me afogar no mar da minha própria negatividade. Se são positivos, posso flutuar no oceano da vida."
Louise Hay

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Diário de Catarina - escritório - colegas III



Ao longo dos anos, os vários colegas que passaram pela repartição deixaram lembranças, até que eu mesma fui embora, deixando velhos e novos colegas naquele lugar onde vivi anos muito bons.

Lembro-me de que os fumantes fumegavam livremente em suas mesas, deixando incomodados muitos colegas, quando veio a proibição de se fumar dentro da repartição, obrigando então a criação de um lugar específico que chamávamos de “fumódromo”.

Nada mais era que um banco grande, no canto do quintal, onde se reuniam todos os fumantes e também vários não fumantes (inclusive eu!). Lá todos tomavam um café, conversavam, riam, riam mais um pouquinho e também fumavam. Alguns freqüentavam o espaço com mais assiduidade, já que a dependência do cigarro falava bem alto, outros até diminuíram o cigarro, e haviam aqueles que mesmo sem fumar compareciam para um papinho. O nosso fumódromo era um lugar muito divertido que logo passou a se chamar “fofocódromo”.

Recordo-me também que já não estávamos na casa adaptada e sim em um novo endereço que merecerá uma descrição mais detalhada brevemente.

O fumante mais inveterado da repartição era o colega que chamarei de Nelson Augusto, que subia e descia ao fumódromo várias vezes por dia, ou seja, quase sempre estava lá. Os colegas iam e vinham e Nelson Augusto continuava lá no banco com seu cigarro. Até que um dia Nelson Augusto desceu com seu cigarro e um jornal, que não conseguiu ler, pois sempre chegava alguém para interrompê-lo.

Nesta época havia um programa de humor na televisão chamado “A Praça é Nossa”, onde vários esquetes se passavam em um banco de praça, em que o dono do programa tentava ler um jornal e sempre era interrompido pelos personagens, que passavam por lá para importuná-lo. E assim nosso fumódromo evoluiu, tornando-se um programa de humor, já que toda vez que eu passava pelo local, lá estava Nelson Augusto fumando e ouvindo alguma história dos personagens que desfilavam durante todo o dia. As histórias que surgiam desses momentos eram deliciosas, e todos riam muito comparando o programa humorístico com nosso dia a dia. Devo dizer que não foram poucas as vezes que nosso “programa” era bem mais engraçado que o original, pois Nelson Augusto com seu humor mordaz fazia muito bem seu papel, fazendo graça de tudo e de todos, sempre com seu inseparável cigarro. 

O único que não apreciava nosso “programa” era o chefe de então, que desde o início da sua gestão quis imprimir um tom austero a repartição, o que não combinava de forma alguma com aquela população de pessoas que sempre foi, a despeito de qualquer coisa, de bem com a vida.

Depois de o nosso programa ter saído do ar, já que muitos personagens foram transferidos ou demitidos, incluindo o ator principal, Nelson Augusto, ele deve ter ficado satisfeito, mas nós levaremos sempre na lembrança os dias felizes e ensolarados que vivemos.

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Diário de Catarina - escritório - Colegas II




Bom dia Catarina!

E mais um dia começava naqueles muitos dias de minha vida na repartição.

A vida ali era diferente, eu que havia trabalhado na sede da empresa com mais de dois mil funcionários, passei a trabalhar em uma repartição com pouco mais de cinqüenta pessoas, em uma casa adaptada.

Minha vida havia mudado muito, estava com minha filha de seis meses, transferida para mais perto de minha casa, era um período de adaptações em tudo, na vida e no trabalho.


Apesar de atender ao público externo, que não nos deixa seguir uma rotina pré-estabelecida de trabalho, os dias eram quase sempre iguais.

Chegava à minha sala, e se já não houvesse alguém do público externo para receber, me dirigia à sala anexa bater um papinho com as colegas, que serão chamadas de Sofia e Solange, e tomar um café (tínhamos uma cafeteira própria!). Lá tratávamos de tudo: capítulo da novela anterior (com direito a análises sócio-culturais), o cardápio do jantar (com direito a receita), reclamações do marido, filhos, família, chefe e etc. (com direito a conselhos), moda, viagens, notícias e fofocas da empresa. Um ambiente de muita descontração com muitas risadas, que nos fez dispensar muitas vezes, anos de terapia. Quando uma de nós não chegava bem por algum motivo particular, após discorrermos sobre todos esses assuntos já ficávamos refeitas para enfrentar o dia de trabalho.

Passamos a andar sempre juntas e ganhamos vários apelidos dos outros funcionários: Mimi, Cocó e Ranheta; as irmãs Cajazeiras, as meninas super-poderosas e por aí vai.

A hora do almoço deveria ser um capítulo a parte, trabalhávamos próximo de um centro comercial e fatalmente, após almoçarmos, dávamos uma voltinha para ver as vitrines. Sempre, eu disse sempre, uma de nós voltava com uma sacola: uma blusa, um baton, um sapato, outro sapato, uma sandália, roupa para o filho, um descascador de camarão, uma tigela, um enfeite e etc. Logo cedo já nos programávamos:  “Hoje tenho que ir lá no centro comercial na hora do almoço ver/comprar .........”. Acho que nunca compramos tantas roupas e sapatos como naquela época, sempre com o apoio das outras duas que, por não querer gastar sozinha, convencia a outra de como aquilo era imprescindível, como a roupa tinha caído bem, como o sapato era lindo e assim por diante.

Veja como mulher se protege para as compras, quando o horário extrapolava muito, uma voltava para repartição enquanto as outras continuavam na loja (uma comprando e a outra dando suporte).

Criamos vários bordões dignos de fazer parte de programas humorísticos, alguns copiamos da televisão, outros foram criados na nossa realidade,  vou contar cada um deles e suas explicações de acordo com as situações. Em relação aos atrasos falávamos o seguinte:

“Fica aí que eu volto e seguro tudo, tudo, tudo amigaaaa”  ou
“ Vai lá que eu  fico e seguro tudo, tudo, tudo amigaaaa”.

Assim mesmo, três vezes o “tudo” e o amiga com a sílaba tônica no “a” final.

No começo ríamos muito com nossos bordões, depois aquilo se incorporava de tal forma ao nosso vocabulário que falávamos naturalmente não nos causando mais impacto, porém, quando soltávamos algum deles para outras pessoas, estas nos olhavam espantadas, tentando entender o que queríamos falar, incluindo nossos maridos.

A vida no serviço público por vezes é muito difícil, temos que conviver com muitas injustiças e tudo é muito moroso para se resolver, mas sabíamos nos abstrair desse clima pesado e criar uma atmosfera descontraída e feliz, a despeito dos problemas que pudéssemos estar passando. Nossa convivência era praticamente restrita ao escritório, cada qual tinha uma vida completamente diferente uma da outra, somos três personalidades completamente diferentes, e talvez por isso nossa convivência tenha sido tão enriquecedora e tenha dado tão certo por um longo período, sem brigas, com muitas risadas e companheirismo.

Hoje cada uma de nós trabalha em uma repartição diferente, mas sempre nos lembraremos da nossa convivência como se fosse um casamento muito feliz, mas que acabou porque a vida de cada uma foi mudando, novos personagens se incluíram nessa convivência. O golpe final e certeiro que selou nosso divórcio foi a transferência de cada uma para outros escritórios, encerrando um ciclo que nos trouxe muita alegria e evolução pessoal e que ficará na saudade.

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Cecília Meireles





Renova-te.

Renasce em ti mesmo.
Multiplica os teus olhos, para verem mais.
Multiplica os teus braços para semeares tudo.
Destrói os olhos que tiverem visto.
Cria outros, para as visões novas.
Destrói os braços que tiverem semeado,
Para se esquecerem de colher.
Sê sempre o mesmo.
Sempre outro. Mas sempre alto.
Sempre longe.
E dentro de tudo.

Cecília Meireles

Diário de Catarina - Escritório - Colegas

COLEGAS



Muitas são as histórias a contar dos muitos colegas que passaram pela repartição. Algumas engraçadas, outras dramáticas, algumas emocionantes e poucas tristes a ponto de não nos permitir alguma graça, felizmente.

Como se tratam de histórias verídicas e recentes, sinto-me acanhada de relatar muitas delas, facilmente reconhecíveis pelos protagonistas, mas, como não expor  algumas pérolas de nossa convivência? E devo me reportar logo no início de minha estada.

É fato que quando da minha chegada, a seção já era antiga, com funcionários de anos trabalhando lá, por isso o meu desconforto inicial, que foi logo superado, já que não me falta audácia para piadinhas com desconhecidos.

Trabalhava em uma sala sozinha, já que atendia ao público externo (alvo de um próximo capitulo), mas muito falante que sou quase nunca parava em minha sala, pois adoro bater um papinho, e na sala anexa trabalhavam duas colegas, tão falantes quanto eu. Nessa ocasião ficava nesta sala um senhor, responsável pelo trabalho com o único computador da seção, pois não haviam computadores pessoais para todos os funcionários como hoje.

Vamos chamá-lo de Nestor, um senhor muito quieto, completamente diferente de nós, três malucas falantes, que passávamos o dia falando bobagens e rindo. Não podemos esquecer que isso ocorreu na época daquele chefe que pouco produzia, já comentado.

Nestor vivia calado no computador, ouvia, ouvia e ouvia, por vezes ria, ficava com o rosto vermelho e dava sua opinião. Quando alguma de nós, sempre muito “antenada” com as fofocas do momento, fazia algum comentário acerca de qualquer assunto, ele dava seu palpite, sempre contrário ou desacreditando das nossas conclusões, com seu ar meio rabugento.

Aquela sala era o centro das conversas, próxima do quintal (sim, era uma casa!), longe do chefe, e com nosso parceiro Nestor e seu computador.  Muitas vezes falávamos alguma coisa de propósito, sabíamos que ele não ia concordar e esperávamos sua reação pouco amistosa.


Até que uma vez, numa costumeira discussão com minha amiga, ele perdeu a calma, e depois de muita argumentação de ambas as partes ele levantou, e com o rosto muito vermelho bradou aos gritos: Por que? Por que? Por que?  Com os braços erguidos e gesticulando muito.


Ela parou, olhou para cada uma de nós assustada pela reação, e imediatamente para quebrar o gelo e acalma-lo levantou e gritou respondendo: Porque sim! Porque sim! Porque sim! Imitando-lhe os gestos.

E tudo acabou em gargalhada. Nem preciso dizer que até hoje quando uma de nós não entende alguma coisa, seja lá o que for, para e grita: Por quê? Por quê? Por quê? E caímos na risada, e quem está perto pensa que somos loucas, e somos mesmo...

A estadia dele nesta sala não durou muito tempo, logo foram chegando os computadores e o layout da seção foi modificado, e o nosso querido Nestor mudou de sala. Por muito tempo encontrávamos com ele e falávamos: Saudade Nestor, volta pra sala!